Garantir a conclusão de obras de pavimentação asfáltica contratadas, pagas e não executadas, ou inacabadas, pela antiga gestão estadual, em 10 municípios do sul do Pará é o objetivo do termo de compromisso proposto pela Auditoria Geral do Estado (AGE) à empresa CFA Construções Ltda, uma das envolvidas na execução do programa Asfalto na Cidade.
Pelo acordo, a empresa arcará com todos os custos de um levantamento para determinar a quantidade e a qualidade dos serviços que já executou. A partir daí, concluirá as obras, inclusive refazendo, do próprio bolso, aquelas em que forem constatados erros ou vícios construtivos. Em troca, a AGE suspenderá os efeitos da medida cautelar que impede a CFA de participar de licitações do Governo do Estado.
A expectativa é que o Termo de Compromisso entre a empresa, a AGE e a Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Obras Públicas (Sedop), o órgão executor do programa, seja assinado no próximo 1 de agosto. A CFA e outras nove construtoras estão suspensas de licitações do Governo, até a conclusão das investigações sobre possíveis irregularidades no Asfalto na Cidade.
“Essa medida demonstra que a AGE não adota apenas o viés punitivo. Pelo contrário: o que buscamos é a conciliação, em prol da sociedade paraense”, disse o auditor-geral do Estado, Giussepp Mendes. Segundo ele, o que a AGE vem tentando é a conclusão das obras que foram deixadas inacabadas pelo governo anterior, e que podem trazer melhorias significativas à qualidade de vida das populações desses municípios.
Ele esclareceu, no entanto, que o acordo não eximirá a empresa de eventual responsabilização cível ou criminal, caso se constatem problemas mais graves, durante as investigações em curso na AGE. Além disso, enfatizou, tudo está condicionado à conclusão dos serviços dentro das exigências contratuais “e sem que isso venha a custar um centavo a mais aos cofres públicos”.
Giussepp Mendes explicou, também, que as negociações para esse acordo só estão sendo possíveis porque os técnicos da AGE constataram que a CFA cumpriu cerca de 70% a 80% do contrato com a Sedop.
MUNICÍPIOS
O auditor-geral do Estado informou, ainda, que outras construtoras que trabalharam no programa também poderão realizar acordos semelhantes, caso também tenham executado quantidades expressivas dos contratos que possuem para o Asfalto na Cidade. A previsão é que o diagnóstico seja realizado em 20 dias, a partir da assinatura do Termo Compromisso, o que poderá permitir a conclusão dos serviços ainda neste ano.
Xinguara, Floresta do Araguaia, Redenção, Pau D’Arco, Conceição do Araguaia, Rio Maria, Tucumã, Sapucaia, Ourilândia do Norte e São Félix do Xingu serão os municípios beneficiados.
Juntas, as 10 empresas suspensas receberam da SEDOP mais de R$ 543 milhões, em valores da época, para serviços de pavimentação em vários municípios, entre 2012 e 2018.
PROBLEMAS
Em uma investigação preliminar, realizada neste ano e que levou à abertura do PAR, a AGE constatou diversos problemas nos contratos dessas empresas, entre os quais a falta de documentos e a inexecução ou má qualidade dos serviços. Também há suspeitas de que alguns dos pagamentos que elas receberam não foram contabilizados no SIAFEM.
INVESTIGAÇÕES
O Asfalto na Cidade é um dos maiores escândalos do Pará. Há suspeitas de superfaturamento, propina, caixa 2, obras de má qualidade ou inacabadas e, sobretudo, uso eleitoreiro do programa em favor do candidato do então governador Simão Jatene, ao Governo do Estado, nas eleições de outubro: o então presidente da Assembleia Legislativa do Pará (Alepa), Márcio Miranda. No ano passado, o programa consumiu R$ 369 milhões, ou mais do que tudo o que gastou nos anos de 2014, 2015, 2016 e 2017, somados, na maior farra de asfalto registrada em um ano eleitoral. As denúncias de irregularidades levaram a abertura de investigações, ainda no ano passado, pelo Ministério Público Estadual (MP-PA) e pela Justiça Eleitoral.
Em janeiro deste ano, o Ministério Público Eleitoral (MPE) pediu a inelegibilidade, por 8 anos, de Jatene, Márcio Miranda, Izabela Jatene, filha do ex-governador, e do ex-secretário da SEDOP, Pedro Abílio Torres do Carmo. Segundo o MPE, houve abuso de poder político e econômico nas eleições de outubro, com o uso do Asfalto na Cidade para turbinar a campanha de Márcio.
O parecer do MPE levou a AGE, que é o principal órgão de fiscalização do Governo, a também abrir uma investigação sobre o caso, já que o uso de recursos públicos em campanhas políticas pode configurar, além de crime eleitoral, improbidade administrativa. As investigações continuam, mas as informações já obtidas impressionam.
Ainda em janeiro, a AGE suspendeu o programa, devido às suspeitas de irregularidades. Mas, nas visitas aos municípios, os técnicos descobriram que, em várias cidades, as obras já haviam sido suspensas no ano passado, logo após a derrota eleitoral do candidato de Jatene. Os técnicos também confirmaram que os serviços foram realizados muitas vezes sem qualquer fiscalização da SEDOP, além de ficarem muito abaixo das quantidades previstas.
A AGE também descobriu fortes indícios de pagamentos antecipados dos serviços, o que é ilegal. Além disso, um engenheiro da SEDOP, que trabalhou como fiscal dos contratos de três dessas empresas, teria admitido que, obedecendo a “ordens superiores”, fraudava os boletins de medição dos serviços. Em 3 de abril, através de uma Representação Criminal, a AGE solicitou que o MP-PA e a Polícia Civil peçam à Justiça a prisão de Jatene. Segundo a AGE, já há provas de um “esquema criminoso” que operou na SEDOP, nos últimos 8 anos, e teria “saqueado” os cofres públicos através do Asfalto na Cidade, com o aval do ex-governador.
Fonte: Jornal A Notícia