A medida provisória que pretende mexer nos critérios para regularização fundiária está pronta e sob análise da Secretaria de Assuntos Jurídicos (SAJ) do Palácio do Planalto, mas um dos principais pontos, a autodeclaração para determinação de áreas a serem regularizadas, ainda causa divergência no governo e pode ficar de fora.
O ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Jorge Oliveira, confirmou à Reuters que “um longo texto” está sendo analisado na secretaria, que é responsável pela SAJ.
Fontes consultadas pela Reuters confirmaram que o texto prevê que a definição da propriedade rural a ser regularizada será feita por autodeterminação — ou seja, o suposto proprietário poderá apenas declarar a posse e apresentar um georreferenciamento da propriedade para receber o título. Caberá ao governo fiscalizar as informações apresentadas.
A proposta é do secretário de Assuntos Fundiários do Ministério da Agricultura, Nabhan Garcia, que diz ter apoio do Congresso. Há dúvidas, no entanto, se a ideia está dentro das normas constitucionais.
Mais do que isso, de acordo com uma das fontes, parte do governo torce para que a medida seja apontada como inconstitucional e não possa ser levada adiante. O temor é que a autodeclaração possa ser vista como mais um instrumento de facilitação de grilagem de terras, especialmente na Amazônia Legal, com o consequente desmatamento.
Desgastado com o aumento do desmatamento e a enorme repercussão internacional das queimadas na Amazônia, o país já sofre ameaças de retaliações por países importadores de produtos agropecuários. Uma medida que poderia facilitar –ou ao menos aparentemente facilitar– irregularidades ambientais poderia piorar ainda mais a situação externa do Brasil.
“O problema é que Nabhan tem o ouvido direto do presidente”, disse uma das fontes.
Autor e defensor da medida, o secretário hoje é visto com restrição mesmo dentro da Frente Parlamentar Agropecuária por suas ideias radicais, mas tem acesso direto a Jair Bolsonaro, passando mesmo por cima da ministra da Agricultura, Tereza Cristina.
“Para que criar dificuldade se nós temos condições de, hoje, com a tecnologia que existe por georreferenciamento, fazer autodeclarável?”, defendeu Nabhan há duas semanas ao falar da medida.
Nabhan briga pela mudança na regularização fundiária desde o início do governo, mas encontrava resistências não apenas no Ministério da Agricultura, como também no Incra, que é responsável pelas medidas. O então presidente do órgão, general João Carlos Jesus Corrêa, resistia a mudar a legislação e chegou a acusar Nabhan de ter “interesses escusos” na regularização fundiária.
Há duas semanas, o secretário conseguiu convencer Bolsonaro a demitir o general, alegando atraso nas regularizações. Perguntado sobre a demissão, admitiu que “levou algumas informações ao presidente”.
Nesta quarta-feira, o governo nomeou o economista ligado ao agronegócio Geraldo Melo Filho como novo presidente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).
Fonte: Reuters