sábado, 23 de novembro de 2024

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Avanço por Amazonas, Roraima e Acre indica interiorização do desmatamento

A devastação está se expandindo para além do tradicional arco do desmatamento em direção ao interior da Região Amazônica. É o que especialistas interpretam com base nos dados estaduais do sistema Prodes, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que foram oficialmente divulgados anteontem.

Estados que em geral apresentavam taxas menores de desmate tiveram altas expressivas neste ano. É o caso de Roraima – que tem uma parcela grande de terras indígenas onde se estima haver grandes reservas de minério. Entre agosto do ano passado e julho deste ano houve uma alta de 216,4% de desmatamento ante o ano anterior.

A devastação passou de 195 km2 para 617 km2. É a segunda maior taxa para o Estado na série histórica. A primeira foi em 1989, primeiro ano do Prodes – 630 km2. Foi o maior aumento porcentual de todos os Estados da Amazônia, em parte por pressão do garimpo

Também chamam a atenção o Acre, que apresentou uma alta de 55% no período, saltando de 444 km2 para 688 km2 – a maior taxa desde 2004; e o Amazonas, que saltou de 1.045 km2 para 1.421 km2 – maior taxa desde 2003. Com esse aumento de 36%, o Estado passou a ocupar o terceiro lugar entre os maiores desmatadores, passando Rondônia.

A troca de posições também se deu porque Rondônia teve uma redução de 5,4% no desmatamento. Houve queda da devastação também no Tocantins (16%), no Maranhão (15%) e no Amapá, a maior delas (66,7%) – o Estado registrou somente 8 km2 de desmatamento

Apesar de Pará e Mato Grosso ainda representarem as maiores porções de desmatamento – os dois Estados respondem por quase 57% da devastação -, os aumentos em outros locais mostram que os atos ilegais estão penetrando na região. “O Prodes deste ano mostra que o desmatamento não está mais tão concentrado, o que parece ter a ver com a redução do controle”, comenta Gilberto Câmara, ex-diretor do Inpe e hoje diretor do secretariado do Grupo de Observações da Terra.

Ele lembra que no Acre o governador Gladson Cameli (PP) recomendou, em evento em julho, que produtores rurais não pagassem multas ambientais que tivessem recebido. “Onde o Estado não está atuando é onde o desmatamento está fugindo de controle”, disse.

Para Raoni Rajão, da Universidade Federal de Minas, os Estados de Amazonas, Acre e Roraima “são novas fronteiras de especulação, não de expansão e produção agropecuária”. Segundo ele, grande parte da perda no Amazonas pode estar ligada à especulação entorno do asfaltamento da BR-319, que liga Porto Velho (RO) a Manaus (AM).

Essa explicação também foi aventada pelo pesquisador Tasso Azevedo, que coordena o Sistema de Estimativa de Emissões de Gases de Efeito Estufa. “O Amazonas tem unidades de conservação na fronteira com Mato Grosso e a leste, com o Pará, que tinham criado uma espécie de barreira, mas o desmatamento começou a subir por Rondônia, chegou a Apuí (uma das localidades que mais queimaram em agosto) e está se espalhando. A grilagem está se deslocando, diante da expectativa de repavimentação da Transamazônica e da BR-319. A grilagem é como a bolsa de valores, cresce com a especulação”, diz.

Estados

O governo do Amazonas disse que reconhece o aumento no desmatamento, mas que representa apenas 0,09% da área do Estado. O governo disse que “91% do desmatamento no Amazonas está concentrado em municípios do sul do Estado, que vêm sofrendo grande pressão da expansão da fronteira agrícola de outros Estados da região” e a região “tem sido foco das ações de combate ao desmatamento ilegal desde o início de 2019”.

Ionilson Sampaio de Souza, secretário da Fundação Estadual do Meio Ambiente e Recursos Hídricos de Roraima, disse ao Estado que os números do Prodes o surpreenderam e o Estado não vinha percebendo o aumento. Israel Milani, secretário de Meio Ambiente do Acre afirmou que o governo “tem atuado de forma rigorosa nas fiscalizações ambientais” e está empenhado em “aproximar o produtor rural do Estado, abrindo um diálogo entre o setor produtivo e o Meio Ambiente”.

Amazonas e Pará fizeram questão de frisar que grande parte do desmatamento nos Estados ocorre em área de domínio da União – 40% e 78%, respectivamente. Eles se anteciparam a uma expectativa de que hoje, em reunião com o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, o governo federal tente responsabilizar os Estados pelo controle do desmatamento.

O presidente Jair Bolsonaro evitou ontem comentar o aumento de 29,5% do desmatamento na Amazônia, a maior taxa desde 2008. Bolsonaro disse que perguntas sobre esses dados não devem ser feitas a ele, mas a Salles.


O presidente disse que tratou sobre o desmatamento com o ministro, mas não poderia apresentar ações planejadas pelo governo, pois o assunto seria reservado. Afirmou depois não querer “publicidade de nada que fazemos, queremos solução”.

 

Fonte: Estadão Conteúdo