Lana Almeida, médica mastologista e ginecologista paraense, se tornou alvo de uma apuração do Conselho Regional de Medicina do Medicina do Estado do Pará (CRM-PA), após divulgar um vídeo no qual diz que “câncer de mama não existe”. E ainda promove tratamentos do chamado “Protocolo Marco Botelho”, pesquisa de um autor de mesmo nome e que ainda não passou por ampla validação científica. Ele chegou a ser preso, no começo do ano, em Pernambuco, por suspeita de exercício ilegal da Medicina.
O vídeo foi publicado no Instagram da médica nesta segunda-feira (28) e depois foi apagado. Lana diz frases como “Esqueça Outubro Rosa” (campanha nacional de combate ao câncer de mama) e critica a mamografia, principal exame e o mais validado para detectar a doença em tempo hábil para combatê-la. Ela diz ser especialista em ultrassonografia das mamas e afirma que o exame “causa inflamação nas mamas”. A médica não apresenta nenhuma evidência científica ou estudo que comprove as alegações dela.
Veja o vídeo que gerou a apuração do CRM-PA. Mas atenção: o vídeo a seguir tem caráter apenas de registro e o Fato Regional não apoia ou valida o discurso da médica. O protocolo defendido por ela ainda carece de validação científica ampla.
Num trecho, Lana minimiza a doença que leva várias mulheres à morte no Brasil ou a perderem os seios ao chamar de “inflamação crônica”. As afirmações são difundidas por Marco Botelho, autor da pesquisa e livros que apontam temas como “cura do câncer”. Em fevereiro deste ano, o Conselho Regional de Odontologia de Pernambuco recebeu uma denúncia contra Marco, que acionou a Polícia Civil pernambucana. Ele foi preso em flagrante e teve o registro cassado. Foi liberado após pagar fiança de R$20 mil.
Por nota, o Conselho Regional de Medicina do Estado do Pará informou que “…tomou conhecimento da postagem no Instagram da Dra. Lana Almeida, devidamente inscrita neste CRM, nesta terça-feira (29), e o fato será objeto de apuração por este regional. Ressaltamos que os procedimentos no CRM-PA tramitam sob sigilo, de acordo com o artigo 1º do Código de Processo Ético-Profissional”.
O Fato Regional respeita o princípio da presunção de inocência e sempre abre espaço para a defesa dos mencionados em casos policiais — se os advogados ou envolvidos acharem conveniente quaisquer manifestações —, garantindo amplo direito ao contraditório. A médica Lana Almeida ainda não se pronunciou após a nota do CRM-PA ser divulgada. O espaço segue aberto.
Pesquisa de Marco Botelho é alvo de críticas de conselhos; autor alega perseguição
Por enquanto, a pesquisa de Marco Botelho, defendida por Lana Almeida, ainda carece de maior validação científica na comunidade internacional, já que propõe uma mudança completa de paradigma sobre o entendimento do câncer e tratamentos da doença. Ele diz se tratar de fruto de 20 anos de pesquisa. A Resolução 199 do Conselho Federal de Odontologia (CFO) proíbe dentistas de promover, ministrar ou divulgar cursos de modulação, reposição ou suplementação hormonal, técnicas mencionadas pelo autor do protocolo.
Marco Botelho afirma ser perseguido numa “inquisição moderna contra um professor, médico, dentista, pesquisador, cientista e servidor público”. Ele conta, nas palestras dele, que desenvolveu a pesquisa quando a mãe dele teve um seio retirado por um diagnóstico de câncer de mama, mas que ele relata ter sido apenas uma concentração de cálcio. E então vem pesquisando para provar que alguns tipos de câncer podem ser inflamações ou outras concentrações de substâncias, que poderiam, em tese, segundo ele, ser tratadas com modulação hormonal.
Desde 2019, as pesquisas, cursos, palestras e livros de Marco Botelho são alvos de procedimentos dos conselhos médicos. A primeira liminar contra Botelho foi obtida pelo CRM de São Paulo, por meio de ofício junto ao Ministério Público, em março de 2019. Com ela, o dentista ficou proibido de ministrar cursos e de divulgar, em suas redes sociais, a técnica de modulação hormonal com nanopartículas, da qual se intitulava criador, para cura de doenças graves, como o câncer. Ele é autor dos livros “Hormônios: o que eles não querem que você saiba” e “Modulação hormonal Nano (R): a vida sem medicamentos: Protocolo Botelho”.
A ação inicial do Cremesp junto à Justiça foi reforçada e ampliada pelos Conselhos Regionais de Medicina de Santa Catarina (CRM-SC), do Ceará (Cremec) e de Odontologia de Santa Catarina, (CRO-SC). “Os falsos tratamentos propagados e comercializados pelo dentista resultaram na primeira prisão, em 16 de agosto de 2019, em Porto Alegre. Mesmo com decisões o proibindo de seguir propagando os cursos e tratamentos sem devida validação científica pelo país”, diz o Cremesp
“O Cremesp reforça que a prática de reposição hormonal é ato estritamente médico, cuja especialidade habilitada é a Endocrinologia e Metabologia. E reitera seu reconhecimento e agradecimento pelos esforços de todos os Conselhos no combate ao charlatanismo e à disseminação de conceitos enganosos em Saúde”, diz nota do conselho paulista de Medicina.
Sindicato dos Médicos do Pará emite nota defendendo mamografia e protocolos de saúde reconhecidos
Também por nota, o Sindicato dos Médicos do Pará (Sindmepa) se posicionou sobre o caso. Leia a nota na íntegra:
O Sindmep vem a público manifestar sua posição em relação ao recente vídeo divulgado pela Dra. Lana Almeida, no qual a médica afirma que o câncer de mama não existe, contraindica a realização de mamografias e desafia as evidências científicas estabelecidas sobre o câncer de mama”.
O Sindmepa reafirma que o câncer de mama é uma condição de saúde séria e amplamente reconhecida, responsável por um número significativo de mortes entre mulheres. A prevenção e o diagnóstico precoce, especialmente através da mamografia, são estratégias fundamentais e baseadas em evidências para a redução da mortalidade e tratamento mais eficaz da doença.
Estudos amplamente documentados e revisados por pares têm mostrado que a mamografia é uma ferramenta essencial para a detecção precoce do câncer de mama. Quando diagnosticado em estágio inicial, o câncer de mama tem maiores chances de cura e tratamento menos agressivo, contribuindo para uma melhor qualidade de vida das pacientes.
Ao público, reforçamos que as recomendações de prevenção e rastreamento, inclusive a realização de mamografias conforme orientação médica, seguem rigorosos protocolos científicos e visam à proteção e ao cuidado da saúde da mulher.
O Sindmepa se compromete a promover e disseminar informações corretas e respaldadas cientificamente para garantir que a população tenha acesso a orientações médicas seguras e responsáveis.
(Victor Furtado, da Redação do Fato Regional)
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