segunda-feira, 29 de abril de 2024

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Saiba tudo sobre a Chacina de Pau D’Arco e o recente assassinato de um dos sobreviventes

Ele era testemunha chave da investigação da chacina. Entenda tudo o que se sabe sobre a chacina e situação atual dos envolvidos.
(Foto: SDDH)

Fernando dos Santos Araújo, de 39 anos, trabalhador rural sem-terra e sobrevivente da Chacina de Pau D’Arco, foi assassinado no mesmo município do massacre, na noite da última terça-feira (26). O caso veio à tona após uma nota conjunta ser publicada pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) e pela Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos (SDDH). O documento pede que o Ministério Público Federal (MPF) acompanhe o caso. A Secretaria de Estado de Segurança Pública e Defesa Social (Segup) também foi demandada.

Clique aqui para ler a nota completa da CPT

“Os depoimentos de Fernando e de outros sobreviventes foram, desde o início, fundamentais para elucidação do caso, antecipando o que os laudos de perícia técnica viriam a confirmar sobre a chacina. Tendo sobrevivido, foi, a um só tempo, vítima e testemunha ocular de um crime abominável, cuja repercussão nacional e internacional é mais uma ferida exposta de nosso país. Fernando morreu. O tiro que o vitimou, fez também outras vítimas. Atingiram a todos nós que lutamos pelo direito à terra no Pará, Amazônia e no país. Sua morte nos obriga a perguntar: Quem matou Fernando? Quem mandou matar Fernando?”, diz a nota da CPT e da SDDH.

A Chacina de Pau D’Arco ocorreu no dia 24 de maio de 2017. Dez trabalhadores rurais foram executados por policiais militares, durante uma operação que seria para cumprimento de 14 mandados de prisão contra suspeitos de matarem um segurança da fazenda Santa Lúcia, uma área de conflito de terra e disputa judicial, onde havia um acampamento das vítimas. Além de os policiais não cumprirem nenhum dos mandados, terminaram a operação com 10 vítimas e algumas delas com sinais de execução. Dois policiais civis, sendo um delegado, participaram da operação. Fernando foi um dos dois sobreviventes.

Após a chacina, todos os ocupantes da fazenda Santa Lúcia fugiram com medo. Algum tempo depois, quando o caso começou a ser investigado e as suspeitas contra os policiais aumentaram, um novo acampamento foi montado e chamado de Jane Júlia. Fernando morava nesse novo acampamento, onde habitam 150 famílias que vivem do que produzem na pequena área. Com a morte de Fernando, essas famílias revivem todo o terror do massacre de 2017, o segundo maior ataque contra camponeses desde o massacre de Eldorado do Carajás, em 17 de abril de 1996, quando 19 trabalhadores sem-terras foram executados pela Polícia Militar.


Desde a nova ocupação da fazenda, as famílias viviam sob a tensão de constantes tentativas de reintegração de posse e despejos ilegais. Somente o poder judiciário pode determinar a desocupação de determinado local e há um procedimento legal para que esse processo ocorra. No local onde os camponeses foram mortos, uma capela foi erguida.

As armas apresentadas pela Polícia Civil após a desastrosa operação malmente funcionavam. (Foto: Ascom PCPA / Arquivo)

O que se sabe sobre a Chacina de Pau D’Arco e a situação atual

No dia 9 de agosto de 2017, com participação da Polícia Federal, a Segup apresentou as primeiras respostas da investigação do caso — que teve repercussão internacional — e também da reconstituição do crime. A conclusão é de que não houve confronto.
Ao todo, 29 policiais estavam escalados para a operação. Oito nem foram para o local do evento trágico. Outros quatro se deslocaram até a fazenda, mas ficaram atolados. E outros quatro participaram do evento, mas não diretamente, pois estavam distantes do local das execuções. O delegado que participou da operação, que seria para cumprimento de quatro mandados de prisão, disse ter sido ameaçado por PMs a participar ou fazer vista grossa. Um policial militar teria dito: “E aí, delegado? Como é que vai ser? Não pode sair ninguém vivo daqui”.
Os policiais alegaram que foram recebidos a tiros na fazenda. Apresentaram várias armas e munições e dois coletes balísticos apreendidos na operação. Porém, nenhum policial foi ferido. Algumas das armas apresentadas nem mesmo funcionavam. Em uma reação regular da polícia, tiros não são dirigidos à cabeça de um suspeito e havia vítimas com marcas de tiros exatamente na cabeça. Alguns policiais confessaram participação no crime em delação premiada.
Foram feitos exames em 53 armas apresentadas, que incluíam as armas usadas pelos policiais e pelos camponeses. Após 2.945 teste de micro-comparação, algumas armas foram identificadas. Cada arma tem uma espécie de “assinatura” na momento do disparo. Da arma de um policial civil — o mesmo que fez uma colaboração premiada com as investigações —, saíram disparos que vitimaram duas pessoas. Da arma de um policial militar, saiu o disparo que matou outra pessoa.
O que mais chamou a atenção do Centro de Perícias Científicas Renato Chaves e da Polícia Civil, durante as investigações, é que, de uma única arma, saíram disparos que vitimaram cinco pessoas. No entanto, essa arma não estava entre as 53 apresentadas aos peritos. Os ferimentos eram de pistola ponto 40. A mesma usada pelos policiais que participaram da chacina. Três policiais militares estavam com escopetas calibre 12. Apenas uma delas fez disparos e que vitimaram a única mulher entre os dez mortos na chacina.
Dos 17 policiais responsabilizados pela chacina, 16 serão submetidos júri popular e estão todos em liberdade. Não há data prevista para esse julgamento. A possibilidade de o massacre ter sido um crime por encomenda de fazendeiros segue sem definição em Marabá. O Ministério Público do Pará (MPPA) denunciou policiais pelos crimes de homicídio, tortura, associação criminosa e fraude processual.
(Victor Furtado, da Redação Fato Regional)