sábado, 27 de abril de 2024

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Vítima de estupro, Mari Ferrer é humilhada em audiência e estuprador é inocentado

OAB e Ministério da Mulher cobram explicações sobre conduta do juiz do TJSC e do advogado de defesa de André de Camargo Aranha, Cláudio Gastão
André de Camargo Aranha está sendo inocentado após ser condenado por um crime que não existe e gerou revolta nas rede sociais: "estupro culposo". (Foto: Reprodução / The Intercept Brasil)
A digital influencer Mariana Ferrer, em 2018, foi estuprada pelo empresário André de Camargo Aranha. O crime ocorreu numa boate de luxo, em uma praia de Florianópolis, capital de Santa Catarina. Há vídeos, exames, fotos, testemunhas e prints de conversas que comprovam. Nada disso foi suficiente para o juiz Rudson Marcos e o promotor de Justiça Thiago Carriço, que tiraram de um crime hediondo, que é o estupro, o dolo.
Ao final de uma audiência, na qual Mariana é humilhada e agredida moral e psicologicamente sucessivas vezes, o acusado é inocentado. Pois a condenação é por um crime que não existe: estupro culposo. O termo é fictício, empregado pelo jornal The Intercept Brasil para designar como o caso foi tratado. O estuprador foi inocentado porque, em tese, “não teve intenção de estuprar”. Crime culposo é aquele em que não se tem intenção de cometer o crime.
Toda a saga de Mariana Ferrer para provar que foi vítima de um crime machista e doloso ganhou as redes sociais digitais. A hashtag #justiçapormariferrer, em setembro deste ano, ficou nos trending topics do Twitter (os assuntos de maior destaque e repercussão). A voz de Mari, como vítima, também foi calada justamente pelas redes sociais, que excluíram relatos e publicações dela.
O caso teve mudanças de delegados, de promotores, idas e vindas judiciais, atendimentos fora de padrão, adulterações de provas e uma sentença inédita no Brasil, com uma tipificação penal inexistente. Corria em segredo de Justiça até que a própria Mariana, cansada de tudo para conseguir justiça após reunir tantas provas, tornou o caso público à força e vídeos das câmeras da boate foram vazados. O exame do Instituto Médico Legal comprovou a conjunção carnal e vestígios do DNA de Aranha, pelo sêmen dele, foram encontrados na moça.
O vídeo da audiência foi revelado pelo site The Intercept Brasil e mostra o advogado de Aranha, Cláudio Gastão, apenas humilhando a vítima. Expôs fotos dela, questionou o comportamento, atacou e tentou, de todas as formas, deslegitimar a condição de vítima de Mariana. Questionou a liberdade dela como mulher e como influenciadora digital, dizendo que tudo era uma armação para ela ganhar seguidores nas redes sociais.
Mariana chorou e nem o choro foi respeitado pelo advogado, que disse se tratar de “choro falso e dissimulado, lágrimas de crocodilo”. Uma das poucas intervenções do juiz Rudson Marcos foi dizer que a moça poderia ter um tempo para se recompor. Ainda chorando, Mari Ferrer pede respeito, pois “nem pessoas acusadas de assassinatos são tratadas assim”.
Quando a jovem disse que o advogado deveria respeitá-la, respeitar a liberdade dela como mulher e que deveria se ater aos fatos, pois ele teria idade para ser pai dela, Gastão chegou a dizer que não teria uma “filha do nível” de Mariana. Diante de tudo isso, o juiz disse que preferia “absolver 100 culpados do que condenar um inocente”. A defesa de Mari Ferrer vai recorrer da decisão.
As humilhações seguiram e Aranha está inocentado por ter cometido um “estupro culposo”, termo inexistente na legislação brasileira e que fez o caso voltar a revoltar internautas nas redes sociais. Principalmente mulheres, que viram na decisão um perigoso precedente para inocentar homens e fortalecer a cultura do estupro. Aranha era acusado, inicialmente, por estupro de vulnerável, pois a moça havia sido dopada antes do crime, logo estava incapaz de consentir uma relação sexual. Ela, à época, tinha 21 anos e era virgem. Não bebia e não usava drogas ilícitas.
Diante da repercussão, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos solicitaram explicações sobre a conduta do advogado Cláudio Gastão e do juiz Rudson Marcos, da terceira Vara Criminal de Florianópolis, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina. E ainda oficiaram o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP).
(Victor Furtado, da Redação Fato Regional, com informações de The Intercept Brasil)